sábado, 9 de julho de 2011

Eça de Queirós


Sob o reinado de D. Maria II , que começara a reinar em .1834, aos quinze anos, Portugal atravessa um período político conturbado; revolução, insurreição, golpe de Estado, guerra civil.

Nesse período, em 25 de novembro de 1845, nasce em Póvoa de Varzim José Maria Eça de Queirós, cujos pais, Carolina Augusta Pereira de Queirós e Dr. José Maria Almeida Teixeira de Queirós, não são oficialmente casados. O casamento só ocorreria quatro anos depois o menino não fica em sua terra natal. É levado à Vila do Conde para viver na casa de uma ama: a costureira Ana Joaquina Leal de Barros, com quem permaneceria até 1849.

A Ribeira, na cidade do Porto
Seu pai tenta ocultar as circunstâncias do nascimento do filho, por temer a censura oficial e para evitar problemas à manutenção de seu cargo público de magistrado. Eça não convive também com seus ir mãos, pois aos quatro anos de idade é transferido para a casa de seus avós paternos, onde viveria até 1855. Aos dez anos é matriculado no Colégio da Lapa, na cidade do Porto. Aluno interno, tem como professor Joaquim da Costa Ramalho (pai do escritor Ramalho Ortigão, que se tornaria seu grande amigo).

Em 1861, com dezesseis anos de idade, transfere-se para Coimbra e começa o curso preparatório para o ingresso na faculdade de Direito. Tímido e sensível, inicia-se na vida boêmia e romântica da cidade. Conhece, então, alguns moços que revolucionam as letras e a política portuguesas: Antero de Quental, Germano Meireles, Alberto Sampaio, Teófilo Braga. Na universidade é um aluno apagado, mas toma gosto pelo teatro estudantil, especializando-se ria interpretação de um pai nobre nas várias peças de que participa.

Universidade de Coimbra
Quanto ao resto, permanece à margem: aprecia apenas de longe a Questão Coimbrã (1865), uma ruidosa polêmica literária que acaba por envolver os principais escritores do país, entre eles Antero de Quental e Teófilo Braga, que torpedeiam o Romantismo ultrapassado do poeta Antônio Feliciano de Castilho.

Em 1866, com o diploma de advogado, o Dr. José Maria Eça de Queirós deixa Coimbra e finalmente dirige-se para a casa dos pais, em Lisboa. Nesse mesmo ano estréia como escritor, publicando no jornal A Gazeta de Portugal o folhetim Notas Marginais.

No ano seguinte passa a dirigir o jornal de oposição Distrito de Évora. Também redator, Eça de Queirós mergulha na realidade de seu país. Em seus artigos começa a emergir o grande escritor realista. Esse realismo acentua-se ainda mais quando o escritor retoma a Lisboa, no final de 1867, e passa a participar do Cenáculo, um vigoroso núcleo intelectual. Reuniões de grupo, debates, idéias e teorias novas. Eça toma contato com o Positivismo e o Socialismo, revê e avalia o Romantismo. Entra para o círculo da geração realista - Anteto de Quental, Oliveira Martins, Batalha Reis, Guerra Junqueiro e outros.

Com seu amigo Rarnalho Ortigão
Em outubro de 1869 em companhia do galante aventureiro conde de Resende, visita o Oriente. Percorre a Palestina e, na qualidade de correspondente do Diário de Notícias, assiste à abertura do canal de Suez no Egito. Ao retomar a Lisboa, em 1870, inicia a publicação em capítulos, nesse periódico, de uma novela policial: O Mistério da Estrada de Sintra, com a colaboração do escritor Ramalho Ortigão, seu único amigo e companheiro de escola.

Convencido da impossibilidade de viver de seus escritos, aos 25 anos Eça tenta a carreira diplomática e classifica-se em primeiro lugar. Contudo, é preterido na indicação para cônsul no Brasil. A irreverência do escritor, então, explode em As Farpas, panfleto de crítica social e política cuja principal arma era o riso, escrito em parceria com Rarnalho Ortigão.

Engajado politicamente, Eça de Queirós participa agora das Conferências Democráticas do Cassino Lisbonense. Profere uma palestra sobre "O Realismo como Nova Expressão de Arte". A nova corrente é definida de forma entusiástica, pelo jovem escritor, como arte de participação e denúncia dos males sociais. Seis dias depois de iniciadas as conferências, uma portaria ministerial as interrompe abruptamente. Em meio às polêmicas do Cassino Lisbonense, dá prova dessa orientação estética no conto Singularidades de uma Rapariga Loura, que seria publicado em 1874.

Em 1871 Eça de Queirós consegue sua nomeação como cônsul nas Antilhas espanholas, mas só no ano seguinte assume o posto, no qual permaneceria até 1874. Depois é transferido para Newcasde-onTyne, na Grã-Bretanha. Ê aí que termina de escrever a primeira versão de O Crime do Padre Amaro. Mas a atitude perfeccionista de Eça faz com que reescreva o romance, que afinal é publicado em 1875.

Caricatura do  Primo Basílio
O Primo Basílio, romance situado na longínqua Lisboa, é publicado em 1878. E Eça de Queirós confessa estar vivendo para a arte: "Eu por aqui - não fazendo, não pensando, não vivendo senso arte. Acabei O Primo Basílio". Nessa vertiginosa atividade literária, o escritor planeja publicar um vasto inquérito sobre a sociedade portuguesa - as Cenas da Vida Real. Mas acaba abandonando o projeto: falta-lhe a "verificação", própria da estética naturalista, conforme a definiu em sua conferência no Cassino.

Apesar do sucesso obtido com O Primo Basílio, o escritor e diplomata vive do ordenado de cônsul, insuficiente para saldar suas numerosas dívidas. "Salva-me, salva-me duma situação que me arruína, me enterra cada dia mais, me preocupa a ponto de me tornar estúpido", escreveria ele a seu amigo Ramalho Ortigão. Além das preocupações financeiras, afligem-no problemas de saúde; à anemia crônica, juntam-se nevralgias dolorosas e fortes abalos de nervos.

Seus vaivéns diplomáticos prosseguem em 1878, quando é transferido de Newcastle para Bristol. Eça, contudo, sente-se só na Inglaterra. Não tem com quem polemizar ou simplesmente trocar idéias. Consola-se escrevendo contos e artigos para a Gazeta de Notícias do Rio de Janeiro. Aos 33 anos de idade Eça pensa em se casar, constituir família, conforme confissão em uma carta a seu amigo Ramalho Ortigão: "precisava duma mulher serena, inteligente, com uma certa fortuna (não muita)... que me adotasse como se adota uma criança...”

Emília de Castro
Essa mulher seria Emília de Castro Pamplona, filha do conde de Resende, seu companheiro de viagem ao Oriente. Com ela se casaria em fevereiro de 1886, aos 40 anos de idade, no oratório particular da casa da jovem, em Ovídio.

Em 1888, dois anos após o casamento, Eça de Queirós assume o último posto de sua carreira diplomática e segue para Paris, dessa vez para sempre. Instala-se em Neuilly, "num recinto ameno e silencioso". Atenua-se agora, também, a irreverência do escritor, sócio da Academia Real de Ciências desde 1883 e à qual não comparece sequer uma vez. Gradativamente Eça de Queirós vai abandonando o Realismo mais esquemático, incursionando para o que chama de "fantasia"; mostra, a essa altura, certa influência da literatura

inglesa. As obras A Relíquia e Os Maias, anteriores' ao, seu casamento, são publicadas em 1887 e 1888.

Em 1889 Eça funda a Revista de Portugal, e nela publica Correspondência de Fradique Mendes. O padrão do escritor, exilado em 'sua torre diplomática, é Fradique Mendes, seu personagem fictício. A irreverência social e o sarcasmo, que o compensam ideologicamente como escritor e cidadão, colidem com as atividades da diplomacia e sua vida burguesa. Seu irreverente personagem Fradique Mendes é a imagem de um escritor realizado, com prestígio mundano.

O Largo do Rossio em Lisboa
O Eça de Queirós demolidor da moral burguesa dos tempos do Cenáculo aspira agora a uma "disciplina intelectual, econômica, moral e doméstica. E o grupo que realizara a Questão Coimbrã, em 1865, nem de longe parece o mesmo. Seus integrantes são, agora, na década de 1880, os Vencidos da Vida: Antero de Quental, Ramalho Ortigão, Guerra Junqueiro e... Eça de Queirós. Não são mais os combativos jovens dos tempos antigos: reúnem-se festivamente em torno de uma mesa de hotel ou de um restaurante para discussão de temas contemporâneos.

O vencidismo fora uma posição "mais intelectual", como o próprio Eça afirmara várias vezes. Mas, segundo o parecer de outros, seus integrantes estavam mesmo era em crise de desalento. E é nessa atmosfera de vencidismo que ele publica A Ilustre Casa ele Ra.mires, iniciada em 1894, e A Cidade e as Serras - canto realista das maravilhas da vida rural.

Com a morte da sogra em 1890, Eça de Queirós herda uma quinta em Santa Cruz do Douro. Além de célebre, tornara-se rico.

O pequeno burguês retirado
A última visita que Eça de Queirós faz a Portugal é em 1900. Envelhecido e doente, parece despedir-se de seu país. Aos 55 anos Eça está acabado. Seu amigo Antero de Quental suicidara-se em 1892. Oliveira Martins havia morrido em 1894. O desaparecimento dos amigos e companheiros de sua geração pressagiava também seu próprio fim. Os médicos recomendam-lhe repouso e, se possível, que deixe a vida agitada de Paris. Em julho de 1900 Eça parte para Glion, próximo a Genebra; escolhera o local julgan10 que ali respiraria uma grande paz. Mas não suporta mais de quinze dias de isolamento. Regressa a Paris, onde as febres, suores e insônia voltam a persegui-lo.

O escritor passa seus últimos dias como um "pequeno burguês retirado", segundo suas próprias palavras. Ironicamente, registra ainda: "faço também literatura, uma literatura 'complicada, porque, com o vício de mistrar trabalho, acho-me envolvido na composição, revisão e acepilhação geral de cinco livros".

Na tarde de 16 de agosto de 1900, em meio ao calor abafado do verão parisiense, morre um dos maiores ficcionistas da literatura portuguesa, acometido por enterocolite, um mal hereditário que o perseguira desde a juventude.

Um grupo celebre. Eça de Queiroz, Oliveira Martins,
Anthero do Quental, Ramalho Ortigão, Guerra Junqueiro

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